Por que está tão difícil descansar?
Quando escolhemos este tema para a CoolBox, tínhamos o objetivo de dispará-la bem no dia 7 de setembro. Mas aí refletimos: poxa vida, a gente fala tanto em saúde mental e no quanto é importante respeitar limites que não seria justo, nem pra nós, nem pra você, o envio de um e-mail em um - provável - dia de folga.
Ainda assim, sabemos que, com ou sem CoolBox, muita gente não resistiu à tentação de checar o e-mail de trabalho ou de finalizar alguma tarefa pendente. E que, apesar do feriado prolongado, a segunda-feira chegou e o cansaço ainda estava ali, como se nada tivesse acontecido.
Vamos falar mais sobre isso?
Alguns números do cansaço
Em um estudo com profissionais de 142 países, 4 em cada 10 disseram ter sentido muita preocupação (41%) ou estresse (40%) e quase 1 em cada 3 sentiu muita dor física (32%) no dia anterior ao questionário. Gallup 2023
81% dos trabalhadores brasileiros se sentem esgotados ao fim do dia. 60% se sentem sem disposição para trabalhar. Pulses + Vittude (2022)
72% dos brasileiros sofrem com algum distúrbio relacionado ao sono Fiocruz 2023
No Brasil, 7 em cada 10 pessoas diagnosticadas com depressão e ansiedade são mulheres. Esgotadas - Think Olga
43% das mulheres em cargos de liderança estão esgotadas, em comparação com apenas 31% dos homens no mesmo nível. McKinsey 2023
O medo de tirar férias
Não sabemos se é o momento ou se foi a atenção seletiva, mas o adiamento da edição nos nutriu com algumas fontes bem importantes para a nossa pesquisa. A começar por esta matéria do Estadão, que aborda o medo de tirar férias por parte de alguns profissionais.
Segundo o texto, muitos colaboradores não se sentem seguros para tirar férias porque a folga nem sempre é bem vista pelas lideranças das empresas. Como consequência, os profissionais ou acabam abrindo mão de parte dos dias livres a que têm direito ou postergam suas férias ao máximo possível.
Parece absurdo, mas a mentalidade de que são os colaboradores que dependem das empresas e não as empresas que dependem dos colaboradores ainda prevalece na mente, arriscamos dizer, da maioria dos empregadores.
Um exemplo é a fala recente do multimilionário australiano Tim Gurner, que defendeu que a atual taxa de desemprego no país deveria aumentar para “lembrar os trabalhadores arrogantes do seu lugar”, em um contexto de baixos índices de produtividade no setor de seu negócio, o de construção civil. Ele se desculpou, obviamente, mas sua opinião estava ali, revelada.
Leia também: A mimir: nosso sono como um dos grandes pilares da vida
Tirar férias ou ter folga é diferente de descansar: conheça o stresslaxing
Traduzido como “o estresse na folga”, stresslaxing é um neologismo criado para definir o constante estado de tensão e de dificuldade de viver o presente e o tempo livre em razão dos altos picos de estresse.
Esta reportagem especial do Portal Gente traz dados sobre o quanto relaxar tem sido um desafio, apontando diferentes maneiras de como o estresse na folga pode se manifestar: ansiedade em adiantar uma demanda durante o fim de semana, dificuldade de assistir um filme sem pausar ou mesmo de prestar atenção a uma conversa.
É como se chegássemos a um ponto de não saber lidar com o ócio e nossa mente estivesse sempre a um passo à frente do momento presente.
Motivos que dificultam o descanso
Neste episódio do podcast “Pra onde vamos”, o antropólogo Michel Alcoforado relaciona a dificuldade de relaxar a fatores como o crescimento do neoliberalismo em nossas relações de trabalho, a linha tênue entre vida pessoal e vida profissional no pós pandemia e a uma dificuldade cultural de dizer não em um país que enaltece o excesso de ocupação e em que até a vadiagem ainda é considerada um contravenção penal.
De fato, sentimos o impacto da sociedade neoliberal pós-pandêmica em nossas relações com o trabalho. A sensação de estarmos em uma eterna corrida cuja linha de chegada não terá lugar para todo mundo é real e frequente. E mesmo quando o descanso é incentivado, o é feito como moeda de troca em prol do aumento da produtividade e do capital.
Tudo isso pode ser aliado ao enfraquecimento da legislação trabalhista e ao aumento do número de profissionais autônomos no Brasil. As férias são um direito garantido pela lei trabalhista brasileira, mas a falta de proteção e a insegurança crescem à medida que os trabalhadores se veem intimidados a se transformarem em pessoas jurídicas.
Um outro fator, e aqui se faz fundamental um recorte, é a sobrecarga das mulheres, que acumulam jornadas infinitas de trabalho e cujo trabalho de cuidado não é reconhecido nem valorizado. E aqui, principalmente neste caso, não podemos sequer atribuir “a dificuldade cultural de dizer não” a uma questão que é estrutural e na qual não se oferece outras opções. O relatório do Think Olga e a Declaração dos Direitos Descansistas, que inclusive já recomendamos por aqui, explicam melhor que nós.
Para concluir aqui a nossa lista de tópicos - que ainda contempla muitos outros fatores - temos a hiperconectividade com a qual ninguém nos ensinou a lidar. Até pouco tempo atrás, conseguíamos encerrar o expediente de trabalho e reiniciar a nossa jornada apenas no dia ou semana seguintes.
Tínhamos um número limitado de pessoas em nosso círculo social, as quais precisávamos manter os laços com encontros presenciais frequentes. O acesso à internet era limitado e não 24 horas. Hoje, ficamos reféns de uma rolagem infinita de telas e de sempre ter um e-mail, uma mensagem, uma notificação para checar.
Pergunta do milhão: como isso impacta minha marca, carreira ou negócio?
Bom, profissionalmente falando, a gente não precisa nem dizer quais são os impactos da falta de descanso e relaxamento em nossas vidas. Irritabilidade, mau-humor, distúrbios do sono, estresse. Quando este último se torna crônico por questões da vida laboral que não foram adequadamente administradas, o resultado é a Síndrome do Burnout, reconhecida pela OMS como fenômeno relacionado ao trabalho desde janeiro de 2022.
De acordo com dados do relatório Global Workforce of the Future, de 2022, a cada 10 trabalhadores, quase 4 afirmam ter passado por um burnout e 23% precisaram pausar a carreira no último ano.
Outro distúrbio apresentado pelos trabalhadores e que também pode ser uma consequência do burnout é a Síndrome do Presenteísmo, que é quando o profissional está fisicamente presente no ambiente de trabalho, mas tem o seu desempenho reduzido por se encontrar debilitado física e psicologicamente.
Seria simplista atribuir somente aos profissionais a responsabilidade pelo reconhecimento de seus limites porque, mais uma vez, estamos falando de questões que são estruturais e de responsabilidade de governos e empresas.
Também é preciso que as empresas desenvolvam uma cultura empática e estimulem o descanso, começando com o respeito ao período de trabalho da sua equipe de colaboradores. E-mails e mensagens podem ser perfeitamente registrados e agendados para envios em horário comercial, por exemplo.
A semana de 4 dias de trabalho também já vem sendo testada e validada em muitos países. No Brasil, 20 empresas participarão do projeto piloto que terá início em novembro e duração de 6 meses.
Voltando à matéria do Estadão, o texto sugere que a inclusão de experiências de férias no pacote de benefícios das empresas pode ser uma boa maneira de demonstrar uma preocupação legítima com o bem-estar dos colaboradores.
De tudo, o mais importante é que as empresas se conscientizem do seu papel social enquanto responsáveis por pessoas melhores e, principalmente, mais saudáveis. Afinal, de que adianta o sucesso se o seu bem mais precioso, as suas pessoas, estão adoecidas?
Se você tem vivenciado algo parecido na sua empresa e precisa de ajuda, fala com a gente! Certeza que nós podemos desenvolver boas soluções em conjunto!
Eu poderia emoldurar essa frase
Quero descansar, mas também quero sair
Quero trabalhar, mas quero me divertir
Quero me cobrar, mas saber não me ouvir
Quero começar, mas quero chegar no fim
Eu 'to pegando leve, tentando descansar
Meu nível de estresse ainda vai me matar
Se a vida vai depressa, com pressa ainda mais
Eu 'to pegando leve, hoje eu não vou trabalhar
- Música Pegando Leve, de “O Terno”
Radar do Futuro-Presente
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